REVISÃO APONTA POTENCIAIS TERAPÊUTICOS DA PSILOCIBINA NO TRATAMENTO DA COMPULSÃO
- Iago Lôbo

- 5 de nov.
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Um artigo australiano publicado em 28 de Outubro de 2025, no periódico científico Genomic Press, investigou os potenciais usos da psilocibina no tratamento da compulsão e do Transtorno Obsessivo Compulsivo em ratos e humanos. O artigo de revisão sistemática analisou as evidências pré-clínicas e clínicas dos efeitos da psilocibina no comportamento obsessivo-compulsivo encontradas nas pesquisas selecionadas.
Seguindo o Protocolo PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses) para revisões sistemáticas, o estudo selecionou 13 pesquisas, sendo 4 delas ensaios clínicos, e as outras 9, ensaios pré-clínicos; enquanto os ensaios clínicos são realizados em voluntários humanos, os ensaios pré-clínicos (estudos anteriores à qualquer experimentação em humanos) são realizados em modelos laboratoriais ou animais. Nos estudos analisados, foram usados camundongos como modelos animais, e também um tipo de camundongo modificado geneticamente, conhecidos “como SAPAP3 knockout”, que vem se consolidando enquanto modelo animal para investigação de quadros de TOC. No caso destes, o gene SAPAP3 é deletado, levando a mudanças sinápticas cerebrais e comportamentos característicos da sintomatologia do TOC, como auto-limpeza excessiva, ansiedade, e movimentos repetitivos.
Nos ensaios em humanos, os pesquisadores puderam observar que uma única dose de psilocibina levou a uma rápida redução de sintomas obsessivo-compulsivos, mesmo entre os pacientes com diagnóstico de Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) e Transtorno Dismórfico Corporal. Este resultado de melhora expressiva dos sintomas em poucos dias é consistente em todos as pesquisas analisadas realizadas em humanos, mesmo nas pesquisas mais antigas: o primeiro estudo revisado, de 2006, administrou doses orais em quantidades crescentes de psilocibina em nove pacientes com TOC resistente ao tratamento, e observaram uma redução da Escala Yale-Brown (usado para medir gravidade dos sintomas do transtorno) de 23% para 100% nas horas seguintes à administração da substância. Já o estudo clínico analisado mais recente, de 2024, investigou 12 pacientes com Transtorno Dismórfico Corporal, diagnóstico relacionado ao TOC: uma dose única de 25mg de psilocibina levou à redução significativa e sustentada dos sintomas por até 12 semanas, e 4 dos pacientes tiveram remissão completa da condição. Vale a ressalva de que nenhum dos 4 estudos em humanos seguiu o modelo de padrão ouro de ensaios randomizados e controlados por duplo-cegamento.
Já nas pesquisas em roedores, enquanto a administração de psilocibina não resultou em mudanças significativas e duradouras de comportamento em camundongos selvagens, entre os ratos SAPAP3 knockout, uma única administração produziu reduções robustas e duradouras no comportamento de autolimpeza - resultado reproduzido e observado nos laboratórios dos diferentes estudos. A revisão conclui que as evidências sugerem que a psilocibina reduz temporariamente os sintomas obsessivo-compulsivos em populações clínicas e produz efeitos anticompulsivos duradouros em modelos animais validados.
Além disso, alguns estudos pré-clínicos observaram também um aumento da densidade de espinhas dendríticas e elevação na expressão de proteínas associadas à neuroplasticidade. Assim, os autores sugerem que os estudos clínicos futuros devem incluir ensaios controlados por placebo de maior porte e incorporar uso de neuroimagem para avaliar o impacto nos circuitos frontoestriatais implicados na fisiopatologia do TOC, além de uma investigação mais aprofundada dos efeitos de psicodélicos no tratamento de distúrbios com características neurobiológicas sobrepostas, como a tricotilomania (compulsão de arrancar os próprios cabelos), a dermatilomania (transtorno de escoriação) e o transtorno de acumulação.
Segundo o Psychedelic Alpha, pelo menos duas empresas já possuem moléculas análogas à psilocibina sendo avaliadas, ambas em fase 1 dos ensaio clínico: a MLS101 da MycoMedica, e a SYNP-101, da Ceruvia. Os resultados da revisão, bem como as pesquisa que investigam o uso terapêutico de psicodélicos no tratamento de comportamentos compulsivos mais uma vez levanta também a questão do uso de análogos psicodélicos não alucinógenos (ou psicolastógenos), como a 1-metilpsilocina, e o papel da experiência psicodélica e do acompanhamento psicoterapêutico no resultado terapêutico final da intervenção com a substância - uma problemática ainda sem consenso, e uma disputa que seguiremos acompanhando por aqui.


